Entrevista com o Dr. Osvaldo Pontes

Entrevista com o Dr. Osvaldo Pontes
L.F. Gostaria de cumprimentar o senhor por todo o seu histórico de serviços ao Ceará e louvar a FACIC por essa iniciativa de reunir técnicos, homens de Governo, parlamentares para debater o problema da seca. O senhor acha que isso mostra bem a evidência, o grau de evolução do empresariado nordestino contribuindo na solução dos magnos problemas da nossa região?

 

O.P. Com certeza! Inicialmente, eu queria resumir o conceito de seca como nós do DNOCS procuramos encarar o fenômeno. Este conceito não é de hoje, este conceito está muito bem expresso e resumido numa magistral definição do primeiro Diretor Geral do DNOCS, o grande homem público, cientista, que foi Miguel Arrojado Lisboa, que, já em 1913, definia como ele concebia o fenômeno da seca. Já naquela época, dizia Arrojado Lisboa, “Seca, num rigor léxico, significa estiagem, falta de umidade. Da chuva, provém a água necessária à vida na Terra. O problema da seca, assim encarado, seria simplesmente o problema da água, isto é, o do seu suprimento. Mas a palavra seca referida a uma porção de território habilitado p4elo homem tem significação muito mais compreensiva. Com efeito, o fenômeno físico da escassez da chuva influi no homem pela operação profunda que dela decorrer para as condições econômicas da região, que por sua vez, se refletem na ordem social. Assim encarada, a seca é um fenômeno muito vasto, de natureza tanto física como econômica e social. O problema das secas é, portanto, um problema múltiplo, verdadeiramente, não há um problema, há problemas. Encarado sob este aspecto de vista, nós teríamos que situar o problema das secas na região nordestina.

 

L.F. Sabemos que o Nordeste é uma região semiárida, de baixa pluviometria, pluviometria média de 600 a 700 mm. Mas esta não é uma característica exclusiva do Nordeste Brasileiro, não é?

 

O.P. Sim, outras regiões do mundo, como a Austrália, Estados Unidos, há também regiões semiárida de baixa pluviosidade. Entretanto, estas regiões não são submetidas ao flagelo das secas, ao flagelo das populações, não são flageladas quando ocorre normalmente esse fenômeno. O problema do Nordeste é agravado porque é uma região onde a região semiárida é densamente povoada. Nós temos no Nordeste uma densidade populacional da ordem de 18 habitantes por quilômetros quadrados, superior à média nacional que é 11 habitantes por quilômetros quadrados. Nas outras regiões semiáridas do mundo, mesmo em países altamente desenvolvidos, como os Estados Unidos, há regiões semiáridas e não têm uma densidade populacional desta magnitude. Isto mostra que o Nordeste brasileiro dispõe de recursos naturais capazes de suportar uma população bastante grande.

Considerando outro fator característico do Nordeste, que é o clima, o clima quente, temperatura média de 23 a 27 graus, com um grande grau de insolação, nós temos 2.800 horas de insolação por ano, temos uma precipitação média de 600 a 700 mm e temos uma evaporação média superior a 2.000mm, significa um balanço hídrico deficitário, normalmente deficitário.

 

L.F. Considerando estas características todas poderíamos abordar o problema numa primeira indagação. Hipoteticamente seria possível mudar o clima?

 

O.P. Veja, os conhecimentos científicos à disposição do homem indicam que não temos hoje recursos tecnológicos seguros para a modificação do clima. Então, embora sejam válidas todas as pesquisas, que inclusive a SUDENE vem desenvolvendo, nesse sentido, com a colaboração do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, programas desenvolvidos pela FUNCEME, pesquisas e experimentações tentando a provocação de chuvas, todas essas iniciativas são válidas, no entanto, nós não temos uma tecnologia segura que permita ao homem modificar o clima em qualquer região. Isto significa que nós devemos conduzir as nossas ações no sentido de conviver com este clima.

 

L.F. Bom, caracterizado o problema dessa forma, eu diria que, como o Governo Federal tem agido diante do problema?

 

O.P. A partir, principalmente, da grande seca de 1877 o Governo Federal vem se preocupando com o problema da seca no Nordeste, com o problema de criar condições para a melhoria das condições de vida dessa população. Considerando este problema característico do Nordeste, este fato essencial para a economia da região, que é o fator água, o DNOCS procurou criar, inicialmente, uma infraestrutura de água, todas as ações do órgão foram, prioritariamente, desenvolvidas para se criar uma reserva de água que pudesse ficar à disposição da população. Desta forma, foram construídos já 253 grandes reservatórios públicos na região. O DNOCS introduziu no Nordeste a tecnologia de construção de barragens de terra, que foi assimilada, inclusive, pelos proprietários rurais, e a quantidade de açudes construídos nas propriedades rurais é muito grande. De maneira que há um potencial de água considerável já a disposição do Nordeste.

Outra fonte de água que foi explorada e desenvolvida pelo Nordeste foi a água subterrânea, apesar das limitações de ordem geológica, que nós sabemos que o Nordeste, em mais de 50% de sua área está num embasamento cristalino, portanto, onde a reserva de água é insignificante. Mesmo assim, se desenvolveu um grande trabalho de perfuração de poços. Temos hoje, já perfurados pelo DNOCS, mais de 12 mil poços na região.

Também iniciado pelo DNOCS e depois pelos órgãos setoriais, foi criada em toda a região do Nordeste uma infraestrutura de estradas, ferrovias, aeroportos e uma infraestrutura social de educação e saúde. Tudo isso vem facilitar o encaminhamento do problema. Devemos ressaltar, dentro dessa política de atuação do Governo no Nordeste, o problema da eletrificação, quer dizer, a criação da CHESF e a extensa malha de rede de transmissão e distribuição, que hoje cobre todo o Nordeste, tem sido um fator de grande importância para a fixação da população e para o desenvolvimento da região.

Ainda nesse sentido, considerando que para viver com o problema da seca, o essencial era o fortalecimento da economia da região, o Governo veio também dotar o Nordeste do instrumento eficaz para o fortalecimento da sua economia, que foi a criação do Banco do Nordeste, cuja atuação dispensa maiores comentários.

Por último, considerando que chegamos a um ponto tal, que havia necessidade de uma integração de todas essas ações do Governo, foi criada a SUDENE, como órgão de planejamento e coordenação de toda a ação do Governo na região Nordeste.

 

L.F. Mais uma indagação: aplicadas todas essas medidas, adotadas todas essas providências, com a atuação desses órgãos, quais foram os resultados obtidos?

 

O.P. De modo muito global, apesar de todos os problemas que, ainda, a região enfrenta, nós constatamos um fortalecimento da economia do Nordeste, apesar de todas suas limitações, a economia do Nordeste vem se desenvolvendo e vem se fortalecendo.

Sabemos que para se desenvolver a economia de uma região deve ser considerado 4 fatores básicos. Nós diríamos que são básicos para o desenvolvimento da economia de uma região, a utilização de recursos humanos, a utilização dos recursos naturais, tecnologia e capital. Esses 4 componentes indispensáveis para o desenvolvimento da economia vêm sendo utilizados racionalmente no Nordeste.

 

L.F. O senhor pode se deter mais particularmente nas ações do DNOCS para, na sua contribuição, para a minimização dos efeitos da seca?

 

O.P. Primeiro, através do programa da irrigação. O programa da irrigação que, apesar de ter sido uma preocupação constante do DNOCS, desde o seu nascimento, somente vem tomando um desenvolvimento mais efetivo a partir de 1970. E este programa de irrigação, que eu considero como problema básico para o desenvolvimento da agricultura nordestina, do meio rural nordestino, ele engloba os 4 fatores do desenvolvimento da economia, ele envolve, na forma como o DNOCS vem concebendo e desenvolvendo seus projetos, uma utilização intensiva dos recursos humanos da região. Os programas de irrigação desenvolvidos pelo DNOCS são altamente absorvedores de mão de obra. É claro que nós poderíamos desenvolver projetos automatizados, grandemente mecanizados, com muito mais rentabilidade econômica do que os projetos do sistema que estamos desenvolvendo através da empresa familiar que absorve grande parcela da mão de obra. Então os recursos humanos são absorvidos, a mão de obra aproveitada e empregada no sentido do aproveitamento racional dos recursos naturais, principalmente dos recursos de água e solo. Eu diria também os recursos de clima, do sol, que é um grande recurso à disposição do Nordeste.

O programa de irrigação emprega, também, capital, porque os investimentos num projeto de irrigação são grandes investimentos, provenientes do Governo Federal, então, é uma maneira de se transferir para a região recursos de capital para desenvolver a região. Esses fatores conjugados têm dado, no projeto de irrigação no Nordeste, excelentes resultados. O adiantado da hora não me permite entrar em maiores considerações, mas nós já temos, no Nordeste, 24 projetos concluídos ou em fase de conclusão, já em operação, com milhares de famílias de colonos já assentados, produzindo com resultados bastante compensadores. No ano passado nós tivemos projetos em que a média da renda líquida obtida pelos colonos foi superior a 90 mil cruzeiros, a produtividade das diversas culturas tem sido muito superior à média do Brasil e atingindo às médias alcançadas em países como Israel, Espanha, onde a irrigação é desenvolvida com alta tecnologia. Esta produtividade é obtida graças a fatores climáticos do Nordeste, graças à temperatura uniforme e constante durante o ano, a grande insolação que favorece o desenvolvimento biológico, como é conhecido.

Nós sabemos que a irrigação, devido, principalmente, ao fator limitante no Nordeste, que é a água, não poderá atingir a mais do que 2% a 3% da área nordestina. Contanto, é um programa absolutamente válido, mas limitado. De maneira que ele não poderia resolver, sozinho, todo o problema do setor agrícola do Nordeste.

Com esta constatação, o DNOCS passou a introduzir uma nova forma de exploração dos seus projetos de irrigação, com vistas a beneficiar uma área maior e a uma população maior. Surgiram então os projetos mistos que são projetos que conjugam a irrigação com a exploração da área de sequeiro.  Vários destes projetos já estão em plena operação, como o Projeto Várzea do Boi, em Tauá, uma das regiões mais secas do Nordeste, onde o projeto é concebido de forma a que cada família receba dois hectares irrigados e uma área de seca de 70 a 90ha. O ano passado foi um ano de teste para o Projeto Várzea do Boi, foi um ano em que praticamente não choveu na região dos Inhamus. E o projeto se desenvolveu dentro da sua concepção e o resultado obtido pelos colonos, no ano passado, que está praticamente no primeiro ano de operação do projeto, onde as famílias não tinham ainda assimilado todas aquelas técnicas, não estavam ainda perfeitamente conscientes e preparados, o projeto já ofereceu resultados bastante satisfatórios, porque a renda média das famílias do Projeto Várzea do Boi, no ano passado, foi superior a 12 mil cruzeiros por família, descontadas todas as despesas das culturas, inclusive, pagamento de taxa de água, impostos e o próprio sustento das famílias.

Com esta concepção do projeto misto, a área a ser transformada e melhorada é bastante aumentada. De maneira que, nestes projetos, estamos introduzindo uma tecnologia para exploração da área seca, que é uma tecnologia de introdução, nestas áreas, de pastagens resistentes a seca, resultado de experimentos que o DNOCS vem desenvolvendo em 6 fazendas experimentais de área seca, com resultados bastante satisfatórios. De maneira que com a introdução, principalmente de pastagens exóticas, resistentes a seca, como o consórcio do Buffel Grass-Stylosanthes Humilis, tem dado resultados bastante satisfatórios e a seca do ano passado que não queríamos, mas serviu para nós como um grande laboratório de testar estes experimentos.

Desta forma, nós vamos ampliando a malha, cobrindo o Nordeste. E com este objetivo já estamos desenvolvendo outro tipo de projeto que nós chamamos Projeto da Zona de Transição.  Sabemos que os nossos projetos de irrigação são, geralmente, concebidos e instalados próximos aos cursos d’água, junto à aluvião. Existe entre a aluvião e o cristalino, realmente, uma faixa de solos melhorados, de solos profundos que permite um tipo de exploração agrícola de melhor porte, é a chamada zona de transição ou os tabuleiros, como são conhecidos. Para estes projetos para essas áreas, estamos desenvolvendo outro tipo de projeto, é o projeto que já está, para a zona de transição de Morada Nova, totalmente concluído, e vai ser iniciada sua implantação este ano, projeto em que cada família recebe um hectare irrigado e uma média de 30 a 36 hectares de sequeiro. De maneira que é um projeto com menores investimentos por família, se pode dar melhor condição de fixação do homem ao solo.

O DNOCS vem se ocupando de aproveitamento mais racional das áreas de montantes dos açudes públicos. Estas áreas que ficam no perímetro dos grandes açudes têm um potencial muito grande a ser aproveitado. A água está próxima e, com a evaporação e a utilização da água do açude para os projetos de irrigação, vai descobrindo uma faixa úmida de solo que poderá ser aproveitada mais racionalmente. Já estamos com oito projetos sendo desenvolvidos para a implantação nas grandes áreas dos grandes açudes públicos do Nordeste, com vistas à fixação de maior número de famílias com condição semelhante a que têm os irrigantes, assistidos e com toda assistência técnica, assistência de capital e assistência social, para que eles se integrem no processo produtivo.

 

L.F. Ainda com vistas ao aproveitamento dos recursos naturais do Nordeste, ainda estão desenvolvendo um aproveitamento mais racional da capacidade dos açudes para a produção de peixe?

 

O.P. Este é um trabalho já tradicional do DNOCS, estamos hoje desenvolvendo um trabalho para organizar os pescadores em colônias de pescadores, no sentido de que eles possam aproveitar mais racionalmente esse potencial dos açudes, para a produção de pescado. Nós sabemos que o peixe é um alimento de alto valor proteico e que pode ser oferecido às populações do Nordeste a baixo custo. É uma maneira de se ajudar a população a melhorar a sua dieta, a população de baixa renda. Esse trabalho vem se desenvolvendo e já temos um convênio assinado com a SUDEP – Superintendência do Desenvolvimento da Pesca e o PESCAR que é o Programa de Pesca Artesanal, no sentido de organizar melhor estes pescadores.  No ano passado tivemos 11.200 pescadores registrados e cadastrados em 100 açudes que são cadastrados pelo DNOCS. Apesar de no ano passado termos liberado a pesca nos açudes, naquelas áreas que estavam assoladas pela seca, apesar de termos tomado esta providência, esses 11.200 pescadores produziram mais de 15 mil toneladas de pescado, no valor bruto de produção superior a 65 milhões de cruzeiros. Esse potencial de pesca poderá ser grandemente aumentado e melhorado. O apoio tecnológico para esse programa é dado pelo Centro de Pesquisas Ideológicas, que o DNOCS mantém junto ao açude Pentecostes, em Pentecoste, e que vem desenvolvendo grandes trabalhos para a solicitação de peixes do Amazonas e de outras bacias com vistas a melhorar o rendimento da pesca.

Por último, outro programa que procura completar o atendimento a estas populações, dentro desta programação de transformação da economia nordestina, economia rural nordestina, programa que foi lançado pelo Presidente da República no ano passado, em agosto, na reunião da SUDENE, e que todas as providências para a sua implementação já estão sendo adotadas e deverá ser iniciado ainda agora no mês de março, com o primeiro contrato de financiamento para o projeto sertanejo que será assinado com o DNOCS e o Banco do Nordeste e um agricultor da região de Sousa, na paraíba, é o Projeto Sertanejo.

 

L.F. Pode falar melhor dos objetivos do Projeto Sertanejo?

 

O.P. O Projeto Sertanejo tem como objetivo principal o fortalecimento da propriedade rural para resistir aos efeitos da seca. Visa levar para a propriedade, a nível de propriedade, toda aquela tecnologia desenvolvida nos Projetos de irrigação e nos Projetos Mistos, de irrigação e sequeiro. Pretende-se criar, em cada propriedade uma fonte de água e um projeto, um miniprojeto de aproveitamento racional dessa água e dos solos da propriedade. Em cada propriedade, pretende-se instalar um projeto de irrigação mínimo, de 2 a 3 há e desenvolver uma tecnologia para aproveitamento da pastagem nativa e das pastagens exóticas, que serão produzidas de acordo com os experimentos que já temos. A mesma filosofia que está sendo adotada no Projeto Várzea do Boi.

Esse projeto tem como concepção geral, aproveitar toda a tecnologia desenvolvida pelas gerências dos perímetros de irrigação, e levar essa tecnologia para beneficiar uma área maior. O Projeto prevê a instalação, até 1980, de 66 núcleos, cada núcleo teria um raio de ação de 30 quilômetros, portanto, cada núcleo teria, inicialmente, um raio de ação de 202 mil hectares, e se prevê que cada núcleo irá beneficiar, transformar, uma média de 200 propriedades por ano instalados, 14 a 16 núcleos, as providências para 12 núcleos já estão definidas e, possivelmente os recursos permitirão a instalação de mais alguns núcleos. De maneira que este Projeto Sertanejo visa cobrir essa malha que, associado aos grandes projetos de irrigação, associado aos projetos mistos de irrigação e sequeiros associados aos projetos da zona de transição, que são projetos governamentais, que serão assistidos pelo Governo, visa também assistir aos proprietários naquelas áreas não atendidas por este projeto. Ao lado disso, teremos ainda, dentro do meio rural nordestino, os projetos agropecuários do FINOR, que são também, projetos de grandes propriedades, porque o Projeto Sertanejo visa somente atender as pequenas propriedades, até 500 hectares.

 

L.F. Então, a ação do Governo, através de todos estes programas, naturalmente, não poderão oferecer resultados imediatos, resultados a curto prazo que possam eliminar de vez o flagelo da seca, quando essa ocorrer eventualmente, não é?

 

O.P. Mas, a continuação desses programas é essencial para que a médio e longo prazo se possa minimizar esses flagelos, esses efeitos danosos que a seca traz para a população nordestina. Achamos que a ação do Governo deve sempre se orientar para esses programas a médio e longo prazo, sem, no entanto, descuidar aqueles problemas assistenciais que deverão ser implementados, no caso da ocorrência de seca e que continuarão a ser inevitável, até que estes programas atinjam um grau de implementação que elimine o problema. Achamos que as ações que devem ser desenvolvidas, devem ser no sentido da continuidade a esse programa, de fortalecer os órgãos regionais, principalmente a SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, o Banco do Nordeste, o DNOCS – Departamento Nacional de Obras Contra as Secas e a CODEFASF – Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, para que disponham de melhor estruturação, de melhores recursos humanos, materiais e tecnológicos, para que esses programas tenham continuidade, principalmente recursos financeiros, evitando a descontinuidade que foi uma característica, principalmente, dos anos anteriores a 64. A história nos mostra, se nós analisarmos os orçamentos do DNOCS, verificamos a intermitência do afluxo de recursos que eram postos à disposição do DNOCS, de maneira que as ações que o órgão desenvolvia não tinham continuidade.

 

L.F. E quanto ao aspecto de apoio tecnológico?

 

O.P. Devemos ressaltar que o Governo, recentemente, instalou, no Nordeste, alguns centros de pesquisas que deverão, a curto prazo, começar a influir nessas providências, melhorar o aspecto do apoio tecnológico a esses programas do Governo, na região. Eu me refiro ao Centro de Pesquisas Trópico Semiárido, instalado em Petrolina, já com equipe de 43 técnicos da mais alta capacitação, inclusive com cursos de pós-graduação no exterior e que já veem estudando todos os problemas inerentes às características próprias do Nordeste, principalmente no que se diz respeito ao aproveitamento dos recursos naturais, a planta xerófila, a pastagem nativa e outros recursos que são naturais do Nordeste.

Também a IMBRAPA já instalou em campina grande o Centro Nacional de pesquisas do Algodão, que é uma grande riqueza, uma grande xerófila, tem uma grande importância na economia nordestina. Já instalou em Cruz das Almas, na Bahia, o Centro Nacional de Pesquisas da Mandioca e da Fruticultura. Já criou e está em fase de instalação, em Sobral, no Ceará, o Centro Nacional de Caprinocultura. Esses Centros de Pesquisas deverão desenvolver aqueles estudos para fornecer o apoio tecnológico da melhoria desses programas de Governo.

 

L.F. E quanto a questão das fontes de serviço?

 

O.P. Há muita gente que pensa que a frente de serviço é uma improvisação, que na frente de serviço o Governo é tomado de surpresa, na ocorrência de uma seca, e por falta de outra medida mais planejada, de melhor efeito, se improvisa a frente de serviço, o que não ocorre mais. A SUDENE tem uma larga experiência na condução da assistência aos flagelados e dispõe de um plano anual que é elaborado com a participação dos governos estaduais e dos órgãos que atuam na região. Esse plano visa ordenar as providências que devem ser desencadeadas tão logo ocorra o fenômeno da seca.

Neste plano são previstas todas as ações de todos os órgãos envolvidos; prevê todas as obras que deverão ser atacadas, no caso de ocorrer a seca; já prevê, inclusive, a estocagem em determinados pontos estratégicos e ferramentas para serem rapidamente usadas no caso da ocorrência de seca. Enfim, a ação de assistência, em caso de ocorrência de seca, está toda ela concebida, dentro de um plano, que, rapidamente, poderá ser implementado.

 

L.F. Creio que a seca tem que ser concebida como uma emergência?

 

O.P.  

Sim, uma catástrofe que ocorre. É como ocorre catástrofes em outras regiões do mundo. Nenhum país se aparelha, se prepara para atender terremotos, quando estes ocorrem. Mobiliza-se todos os instrumentos de Governo para atender à população flagelada. É a mesma coisa que ocorre com o problema da seca. Nós não podemos nos dar ao luxo de nos manter, toda uma estrutura ociosa montada, prontinha, esperando a ocorrência de seca para ser acionada.

Este problema não é fácil mas tem sido uma preocupação constante de todos os órgãos, tanto da SUDENE, quanto do DNOCS, quanto dos governos estaduais, procurar tirar o melhor proveito possível daquelas frentes de serviço.

No ano passado, já ficou muito patenteada esta preocupação. As frentes de serviço, por exemplo, do DNOCS, foram, de preferência, deslocadas para projetos de irrigação, com vistas a que o trabalho ali desenvolvido fosse uma contribuição real ao problema geral que se procura resolver, implementar, dar uma contribuição ao projeto de irrigação. Isso já foi feito o ano passado.

Outra mão de obra de emergência foi, também utilizada no ano passado, na construção de pequenos e médios açudes e que, inclusive, estamos procurando, aqueles que estão a cargo do DNOCS, recursos para concluir esses açudes, mesmo que esteja concluído o período de seca, com vistas a que os vultosos recursos que foram empregados naquelas frentes de serviços, tenham um resultado mais positivo.

Acredito que, no momento, não exista, à disposição dos órgãos, outra solução para atender à emergência, a não ser as frentes de serviço. O que nós devemos nos preocupar é, realmente, tirar o melhor proveito desta mão de obra, destes recursos que são despendidos nas frentes de serviço para que contribuam para o programa geral, a longo prazo.

 

L.F. A água é fator limitativo, mas são reconhecidos os resultados dos açudes construídos em cooperação com particulares, pergunto se não seria aconselhável o retorno da política antiga de construção de açudes em cooperação, serviria para possibilitar irrigação a baixo custo e ao mesmo tempo aumentar a possibilidade da produção?

 

O.P. O DNOCS desenvolveu, durante algum tempo, aquele programa de construção de açudes pelo sistema de cooperação. O DNOCS elaborava o projeto e entrava com o prêmio que equivale a 50% do valor da construção. Posteriormente, esse programa foi desativado, considerando que era paternalista e não devia o Governo doar um prêmio ao proprietário. Mas esse programa de construção de açudes vai ser retomado, agora, através do Projeto Sertanejo, em condições muito melhores do que aquele programa anterior, simplesmente da construção do açude.

Nós sabemos que o açude é importante no Nordeste, em virtude do problema da água, há necessidade de reparar água, há necessidade de criar em cada propriedade uma fonte de água que independa da chuva. Mas o açude, sozinho, não resolve o problema, ele tem que ser complementado com seu aproveitamento, ou através da irrigação ou outro qualquer aproveitamento. E o Projeto Sertanejo, como que inspirado no programa de açudagem em cooperação, voltar com esse programa, mas numa roupagem bem mais eficiente, porque o Projeto Sertanejo vai permitir que o proprietário pequeno e médio construa seu açude e sua irrigação, com financiamento do Governo, em condições extremamente favoráveis.

O Projeto Sertanejo prevê o financiamento até 450 mil cruzeiros por propriedade, em condições de juro de 2% ao ano, com o prazo de 20 anos para pagar e 6 anos de carência. Quer dizer, estas condições de financiamento são as mais favoráveis que já foram postas à disposição do proprietário. Não temos dúvida nenhuma de que o Projeto Sertanejo é muito superior àquele projeto de cooperação que o DNOCS hoje não está fazendo.

 

L.F. Sempre se fala em açudagem, poços profundos, e ficou esquecido, justamente, a grande ajuda a estas áreas da irrigação. É sabido que nossos rios, durante os períodos de chuva corre com abundante água, levando umidade às suas margens. Logo que termina o período de chuva os rios secam e acontece o fenômeno contrário, passam a ser drenos naturais. Por que não se desenvolve o regime das barragens vertedoras e das barragens submersas?

 

O.P. O problema é o seguinte. O DNOCS hoje está desenvolvendo sua ação nos grandes vales. E, hoje, nós iniciamos o estudo do vale como um plano diretor para o desenvolvimento do vale. Estamos desenvolvendo, atualmente, estudos como foi feito para o Vale do Jaguaribe. No Vale do Jaguaribe, a partir de 1962, através da missão francesa foram estudados todos os recursos do Vale do Jaguaribe e elaborado um Plano Diretor para o desenvolvimento do vale. Esse plano diretor envolvia o Vale do Gurgueia, o Baixo Parnaíba, o Acaraú, o Apodi, o Açu etc.

De acordo com estes estudos são indicadas todas as soluções possíveis de serem implementadas para o desenvolvimento daquele vale, para um aproveitamento, principalmente, com vistas ao aproveitamento racional de água e solo existentes no vale.

De maneira que esse mesmo estudo vai ser feito a nível de propriedade, no caso do Projeto Sertanejo, a nível de núcleo que será um estudo mais integrado e desenvolvido pela SUDENE, e a nível de cada propriedade será desenvolvido, indicado o projeto de transformação daquela propriedade, indicando todas as obras que terão de ser feitas para tornar aquelas propriedades resistentes a seca.

De maneira que o problema da barragem submersa, da barragem vertedora é um caso a ser estudado de acordo com as condições locais. Existe uma preocupação muito grande, hoje, em todo o Governo, no problema do aproveitamento e da preservação dos recursos de água no Nordeste, da definição de uma política de utilização da água do Nordeste. A SUDENE já está desenvolvendo estudos neste sentido, porque este problema da construção de açudes deve obedecer a uma disciplinação.

 

L.F. O que o senhor acha do aproveitamento da mão de obra ociosa, por ocasião das secas, nas próprias propriedades rurais atingidas? Para o deputado Ernesto Valente, por meio de financiamentos bancários ou de bolsas de trabalho, com financiamento subsidiado, juros subsidiados, prazo de carência a longo prazo, ao invés do deslocamento da imensa massa de trabalhadores para as frentes de trabalho, representam o ordenamento de plano da SUDENE. Isto porque se dá o aproveitamento dessa massa humana de trabalhadores nas próprias propriedades agrícolas?

 

O.P. O problema levantado pelo Deputado Ernesto Valente é um problema que já foi analisado, principalmente pela SUDENE, o problema se reveste de uma complexidade muito grande. Realmente, o ideal e o que se procura fazer com o Projeto Sertanejo, com programas de irrigação, com programas de áreas mistas etc, é a fixação do homem na propriedade. A longo prazo, são todos esses programas que estão sendo desenvolvidos, mas quando ocorre a seca, naturalmente, o proprietário não tem condições, devido a estrutura de sua propriedade, de reter aqueles seus moradores. Então, aquela mão de obra fica disponível e procura assistência. Como assisti-la?

Assisti-lo na propriedade, o Governo procura fazê-lo através dos financiamentos. Se o Governo, por exemplo, no ano passado, ofereceu condições para investimentos, créditos a condições extremamente favoráveis para aqueles proprietários que quisessem empregar sua mão de obra disponível, melhorar sua estrutura da propriedade, para faturamento e o tornar mais resistente a seca.

Mas a forma que o Deputado Ernesto Valente levantou, do Governo dar o dinheiro ao proprietário para, simplesmente, pagar a mão de obra e ela ficar na propriedade, até agora não foi considerada válida, pela SUDENE, tornar-se-ia extremamente difícil o controle da frequência dessa mão de obra, o controle do pagamento, o controle do rendimento dessa mão de obra. Mas, as linhas de crédito já existem para isso. O Dr. Salmito pode informar, no ano passado, quais foram as condições de crédito oferecidos aos proprietários, especiais, em função da emergência e somente aplicados naquelas áreas onde estava ocorrendo a seca.

Uma ideia do Senhor Mauro Rangel é um programa em que cada empresa apresentaria, previamente, um plano para fazer aplicações, aqueles investimentos que tornam a propriedade mais resistente, menos vulnerável, no caso de seca. Nesse plano se definiria os itens a serem cumpridos, a mão de obra necessária e um orçamento. Esse plano seria encaminhado, para que fosse estendido a todo o Nordeste, a ideia final deverá ser esta, à SUDENE então a SUDENE teria, de cada propriedade agrícola, um plano que seria executado no caso de se configurar uma seca. Para tornar-se mais fácil o controle, os agentes financeiros, os bancos oficiais, os bancos estaduais é que caberiam liberar estes recursos. Então, os recursos para financiar seriam esses que o Governo utiliza para manter a frente de serviço, e a frente de serviço ficaria como uma reserva estratégica, seria o seguro de desemprego, então ela não seria, na verdade, extinta mas permaneceria como uma reserva e essa massa de recursos seria então alocada nas propriedades, naquelas condições do Projeto Sertanejo, ou seja, 20 anos, 2% de juro ou até a fundo perdido.

 

L.F. Gostaria de cumprimentar o senhor por todo o seu histórico de serviços ao Ceará e louvar a FACIC por essa iniciativa de reunir técnicos, homens de Governo, parlamentares para debater o problema da seca. O senhor acha que isso mostra bem a evidência, o grau de evolução do empresariado nordestino contribuindo na solução dos magnos problemas da nossa região?

 

O.P. Com certeza! Inicialmente, eu queria resumir o conceito de seca como nós do DNOCS procuramos encarar o fenômeno. Este conceito não é de hoje, este conceito está muito bem expresso e resumido numa magistral definição do primeiro Diretor Geral do DNOCS, o grande homem público, cientista, que foi Miguel Arrojado Lisboa, que, já em 1913, definia como ele concebia o fenômeno da seca. Já naquela época, dizia Arrojado Lisboa, “Seca, num rigor léxico, significa estiagem, falta de umidade. Da chuva, provém a água necessária à vida na Terra. O problema da seca, assim encarado, seria simplesmente o problema da água, isto é, o do seu suprimento. Mas a palavra seca referida a uma porção de território habilitado p4elo homem tem significação muito mais compreensiva. Com efeito, o fenômeno físico da escassez da chuva influi no homem pela operação profunda que dela decorrer para as condições econômicas da região, que por sua vez, se refletem na ordem social. Assim encarada, a seca é um fenômeno muito vasto, de natureza tanto física como econômica e social. O problema das secas é, portanto, um problema múltiplo, verdadeiramente, não há um problema, há problemas. Encarado sob este aspecto de vista, nós teríamos que situar o problema das secas na região nordestina.

 

L.F. Sabemos que o Nordeste é uma região semiárida, de baixa pluviometria, pluviometria média de 600 a 700 mm. Mas esta não é uma característica exclusiva do Nordeste Brasileiro, não é?

 

O.P. Sim, outras regiões do mundo, como a Austrália, Estados Unidos, há também regiões semiárida de baixa pluviosidade. Entretanto, estas regiões não são submetidas ao flagelo das secas, ao flagelo das populações, não são flageladas quando ocorre normalmente esse fenômeno. O problema do Nordeste é agravado porque é uma região onde a região semiárida é densamente povoada. Nós temos no Nordeste uma densidade populacional da ordem de 18 habitantes por quilômetros quadrados, superior à média nacional que é 11 habitantes por quilômetros quadrados. Nas outras regiões semiáridas do mundo, mesmo em países altamente desenvolvidos, como os Estados Unidos, há regiões semiáridas e não têm uma densidade populacional desta magnitude. Isto mostra que o Nordeste brasileiro dispõe de recursos naturais capazes de suportar uma população bastante grande.

Considerando outro fator característico do Nordeste, que é o clima, o clima quente, temperatura média de 23 a 27 graus, com um grande grau de insolação, nós temos 2.800 horas de insolação por ano, temos uma precipitação média de 600 a 700 mm e temos uma evaporação média superior a 2.000mm, significa um balanço hídrico deficitário, normalmente deficitário.

 

L.F. Considerando estas características todas poderíamos abordar o problema numa primeira indagação. Hipoteticamente seria possível mudar o clima?

 

O.P. Veja, os conhecimentos científicos à disposição do homem indicam que não temos hoje recursos tecnológicos seguros para a modificação do clima. Então, embora sejam válidas todas as pesquisas, que inclusive a SUDENE vem desenvolvendo, nesse sentido, com a colaboração do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais, programas desenvolvidos pela FUNCEME, pesquisas e experimentações tentando a provocação de chuvas, todas essas iniciativas são válidas, no entanto, nós não temos uma tecnologia segura que permita ao homem modificar o clima em qualquer região. Isto significa que nós devemos conduzir as nossas ações no sentido de conviver com este clima.

 

L.F. Bom, caracterizado o problema dessa forma, eu diria que, como o Governo Federal tem agido diante do problema?

 

O.P. A partir, principalmente, da grande seca de 1877 o Governo Federal vem se preocupando com o problema da seca no Nordeste, com o problema de criar condições para a melhoria das condições de vida dessa população. Considerando este problema característico do Nordeste, este fato essencial para a economia da região, que é o fator água, o DNOCS procurou criar, inicialmente, uma infraestrutura de água, todas as ações do órgão foram, prioritariamente, desenvolvidas para se criar uma reserva de água que pudesse ficar à disposição da população. Desta forma, foram construídos já 253 grandes reservatórios públicos na região. O DNOCS introduziu no Nordeste a tecnologia de construção de barragens de terra, que foi assimilada, inclusive, pelos proprietários rurais, e a quantidade de açudes construídos nas propriedades rurais é muito grande. De maneira que há um potencial de água considerável já a disposição do Nordeste.

Outra fonte de água que foi explorada e desenvolvida pelo Nordeste foi a água subterrânea, apesar das limitações de ordem geológica, que nós sabemos que o Nordeste, em mais de 50% de sua área está num embasamento cristalino, portanto, onde a reserva de água é insignificante. Mesmo assim, se desenvolveu um grande trabalho de perfuração de poços. Temos hoje, já perfurados pelo DNOCS, mais de 12 mil poços na região.

Também iniciado pelo DNOCS e depois pelos órgãos setoriais, foi criada em toda a região do Nordeste uma infraestrutura de estradas, ferrovias, aeroportos e uma infraestrutura social de educação e saúde. Tudo isso vem facilitar o encaminhamento do problema. Devemos ressaltar, dentro dessa política de atuação do Governo no Nordeste, o problema da eletrificação, quer dizer, a criação da CHESF e a extensa malha de rede de transmissão e distribuição, que hoje cobre todo o Nordeste, tem sido um fator de grande importância para a fixação da população e para o desenvolvimento da região.

Ainda nesse sentido, considerando que para viver com o problema da seca, o essencial era o fortalecimento da economia da região, o Governo veio também dotar o Nordeste do instrumento eficaz para o fortalecimento da sua economia, que foi a criação do Banco do Nordeste, cuja atuação dispensa maiores comentários.

Por último, considerando que chegamos a um ponto tal, que havia necessidade de uma integração de todas essas ações do Governo, foi criada a SUDENE, como órgão de planejamento e coordenação de toda a ação do Governo na região Nordeste.

 

L.F. Mais uma indagação: aplicadas todas essas medidas, adotadas todas essas providências, com a atuação desses órgãos, quais foram os resultados obtidos?

 

O.P. De modo muito global, apesar de todos os problemas que, ainda, a região enfrenta, nós constatamos um fortalecimento da economia do Nordeste, apesar de todas suas limitações, a economia do Nordeste vem se desenvolvendo e vem se fortalecendo.

Sabemos que para se desenvolver a economia de uma região deve ser considerado 4 fatores básicos. Nós diríamos que são básicos para o desenvolvimento da economia de uma região, a utilização de recursos humanos, a utilização dos recursos naturais, tecnologia e capital. Esses 4 componentes indispensáveis para o desenvolvimento da economia vêm sendo utilizados racionalmente no Nordeste.

 

L.F. O senhor pode se deter mais particularmente nas ações do DNOCS para, na sua contribuição, para a minimização dos efeitos da seca?

 

O.P. Primeiro, através do programa da irrigação. O programa da irrigação que, apesar de ter sido uma preocupação constante do DNOCS, desde o seu nascimento, somente vem tomando um desenvolvimento mais efetivo a partir de 1970. E este programa de irrigação, que eu considero como problema básico para o desenvolvimento da agricultura nordestina, do meio rural nordestino, ele engloba os 4 fatores do desenvolvimento da economia, ele envolve, na forma como o DNOCS vem concebendo e desenvolvendo seus projetos, uma utilização intensiva dos recursos humanos da região. Os programas de irrigação desenvolvidos pelo DNOCS são altamente absorvedores de mão de obra. É claro que nós poderíamos desenvolver projetos automatizados, grandemente mecanizados, com muito mais rentabilidade econômica do que os projetos do sistema que estamos desenvolvendo através da empresa familiar que absorve grande parcela da mão de obra. Então os recursos humanos são absorvidos, a mão de obra aproveitada e empregada no sentido do aproveitamento racional dos recursos naturais, principalmente dos recursos de água e solo. Eu diria também os recursos de clima, do sol, que é um grande recurso à disposição do Nordeste.

O programa de irrigação emprega, também, capital, porque os investimentos num projeto de irrigação são grandes investimentos, provenientes do Governo Federal, então, é uma maneira de se transferir para a região recursos de capital para desenvolver a região. Esses fatores conjugados têm dado, no projeto de irrigação no Nordeste, excelentes resultados. O adiantado da hora não me permite entrar em maiores considerações, mas nós já temos, no Nordeste, 24 projetos concluídos ou em fase de conclusão, já em operação, com milhares de famílias de colonos já assentados, produzindo com resultados bastante compensadores. No ano passado nós tivemos projetos em que a média da renda líquida obtida pelos colonos foi superior a 90 mil cruzeiros, a produtividade das diversas culturas tem sido muito superior à média do Brasil e atingindo às médias alcançadas em países como Israel, Espanha, onde a irrigação é desenvolvida com alta tecnologia. Esta produtividade é obtida graças a fatores climáticos do Nordeste, graças à temperatura uniforme e constante durante o ano, a grande insolação que favorece o desenvolvimento biológico, como é conhecido.

Nós sabemos que a irrigação, devido, principalmente, ao fator limitante no Nordeste, que é a água, não poderá atingir a mais do que 2% a 3% da área nordestina. Contanto, é um programa absolutamente válido, mas limitado. De maneira que ele não poderia resolver, sozinho, todo o problema do setor agrícola do Nordeste.

Com esta constatação, o DNOCS passou a introduzir uma nova forma de exploração dos seus projetos de irrigação, com vistas a beneficiar uma área maior e a uma população maior. Surgiram então os projetos mistos que são projetos que conjugam a irrigação com a exploração da área de sequeiro.  Vários destes projetos já estão em plena operação, como o Projeto Várzea do Boi, em Tauá, uma das regiões mais secas do Nordeste, onde o projeto é concebido de forma a que cada família receba dois hectares irrigados e uma área de seca de 70 a 90ha. O ano passado foi um ano de teste para o Projeto Várzea do Boi, foi um ano em que praticamente não choveu na região dos Inhamus. E o projeto se desenvolveu dentro da sua concepção e o resultado obtido pelos colonos, no ano passado, que está praticamente no primeiro ano de operação do projeto, onde as famílias não tinham ainda assimilado todas aquelas técnicas, não estavam ainda perfeitamente conscientes e preparados, o projeto já ofereceu resultados bastante satisfatórios, porque a renda média das famílias do Projeto Várzea do Boi, no ano passado, foi superior a 12 mil cruzeiros por família, descontadas todas as despesas das culturas, inclusive, pagamento de taxa de água, impostos e o próprio sustento das famílias.

Com esta concepção do projeto misto, a área a ser transformada e melhorada é bastante aumentada. De maneira que, nestes projetos, estamos introduzindo uma tecnologia para exploração da área seca, que é uma tecnologia de introdução, nestas áreas, de pastagens resistentes a seca, resultado de experimentos que o DNOCS vem desenvolvendo em 6 fazendas experimentais de área seca, com resultados bastante satisfatórios. De maneira que com a introdução, principalmente de pastagens exóticas, resistentes a seca, como o consórcio do Buffel Grass-Stylosanthes Humilis, tem dado resultados bastante satisfatórios e a seca do ano passado que não queríamos, mas serviu para nós como um grande laboratório de testar estes experimentos.

Desta forma, nós vamos ampliando a malha, cobrindo o Nordeste. E com este objetivo já estamos desenvolvendo outro tipo de projeto que nós chamamos Projeto da Zona de Transição.  Sabemos que os nossos projetos de irrigação são, geralmente, concebidos e instalados próximos aos cursos d’água, junto à aluvião. Existe entre a aluvião e o cristalino, realmente, uma faixa de solos melhorados, de solos profundos que permite um tipo de exploração agrícola de melhor porte, é a chamada zona de transição ou os tabuleiros, como são conhecidos. Para estes projetos para essas áreas, estamos desenvolvendo outro tipo de projeto, é o projeto que já está, para a zona de transição de Morada Nova, totalmente concluído, e vai ser iniciada sua implantação este ano, projeto em que cada família recebe um hectare irrigado e uma média de 30 a 36 hectares de sequeiro. De maneira que é um projeto com menores investimentos por família, se pode dar melhor condição de fixação do homem ao solo.

O DNOCS vem se ocupando de aproveitamento mais racional das áreas de montantes dos açudes públicos. Estas áreas que ficam no perímetro dos grandes açudes têm um potencial muito grande a ser aproveitado. A água está próxima e, com a evaporação e a utilização da água do açude para os projetos de irrigação, vai descobrindo uma faixa úmida de solo que poderá ser aproveitada mais racionalmente. Já estamos com oito projetos sendo desenvolvidos para a implantação nas grandes áreas dos grandes açudes públicos do Nordeste, com vistas à fixação de maior número de famílias com condição semelhante a que têm os irrigantes, assistidos e com toda assistência técnica, assistência de capital e assistência social, para que eles se integrem no processo produtivo.

 

L.F. Ainda com vistas ao aproveitamento dos recursos naturais do Nordeste, ainda estão desenvolvendo um aproveitamento mais racional da capacidade dos açudes para a produção de peixe?

 

O.P. Este é um trabalho já tradicional do DNOCS, estamos hoje desenvolvendo um trabalho para organizar os pescadores em colônias de pescadores, no sentido de que eles possam aproveitar mais racionalmente esse potencial dos açudes, para a produção de pescado. Nós sabemos que o peixe é um alimento de alto valor proteico e que pode ser oferecido às populações do Nordeste a baixo custo. É uma maneira de se ajudar a população a melhorar a sua dieta, a população de baixa renda. Esse trabalho vem se desenvolvendo e já temos um convênio assinado com a SUDEP – Superintendência do Desenvolvimento da Pesca e o PESCAR que é o Programa de Pesca Artesanal, no sentido de organizar melhor estes pescadores.  No ano passado tivemos 11.200 pescadores registrados e cadastrados em 100 açudes que são cadastrados pelo DNOCS. Apesar de no ano passado termos liberado a pesca nos açudes, naquelas áreas que estavam assoladas pela seca, apesar de termos tomado esta providência, esses 11.200 pescadores produziram mais de 15 mil toneladas de pescado, no valor bruto de produção superior a 65 milhões de cruzeiros. Esse potencial de pesca poderá ser grandemente aumentado e melhorado. O apoio tecnológico para esse programa é dado pelo Centro de Pesquisas Ideológicas, que o DNOCS mantém junto ao açude Pentecostes, em Pentecoste, e que vem desenvolvendo grandes trabalhos para a solicitação de peixes do Amazonas e de outras bacias com vistas a melhorar o rendimento da pesca.

Por último, outro programa que procura completar o atendimento a estas populações, dentro desta programação de transformação da economia nordestina, economia rural nordestina, programa que foi lançado pelo Presidente da República no ano passado, em agosto, na reunião da SUDENE, e que todas as providências para a sua implementação já estão sendo adotadas e deverá ser iniciado ainda agora no mês de março, com o primeiro contrato de financiamento para o projeto sertanejo que será assinado com o DNOCS e o Banco do Nordeste e um agricultor da região de Sousa, na paraíba, é o Projeto Sertanejo.

 

L.F. Pode falar melhor dos objetivos do Projeto Sertanejo?

 

O.P. O Projeto Sertanejo tem como objetivo principal o fortalecimento da propriedade rural para resistir aos efeitos da seca. Visa levar para a propriedade, a nível de propriedade, toda aquela tecnologia desenvolvida nos Projetos de irrigação e nos Projetos Mistos, de irrigação e sequeiro. Pretende-se criar, em cada propriedade uma fonte de água e um projeto, um miniprojeto de aproveitamento racional dessa água e dos solos da propriedade. Em cada propriedade, pretende-se instalar um projeto de irrigação mínimo, de 2 a 3 há e desenvolver uma tecnologia para aproveitamento da pastagem nativa e das pastagens exóticas, que serão produzidas de acordo com os experimentos que já temos. A mesma filosofia que está sendo adotada no Projeto Várzea do Boi.

Esse projeto tem como concepção geral, aproveitar toda a tecnologia desenvolvida pelas gerências dos perímetros de irrigação, e levar essa tecnologia para beneficiar uma área maior. O Projeto prevê a instalação, até 1980, de 66 núcleos, cada núcleo teria um raio de ação de 30 quilômetros, portanto, cada núcleo teria, inicialmente, um raio de ação de 202 mil hectares, e se prevê que cada núcleo irá beneficiar, transformar, uma média de 200 propriedades por ano instalados, 14 a 16 núcleos, as providências para 12 núcleos já estão definidas e, possivelmente os recursos permitirão a instalação de mais alguns núcleos. De maneira que este Projeto Sertanejo visa cobrir essa malha que, associado aos grandes projetos de irrigação, associado aos projetos mistos de irrigação e sequeiros associados aos projetos da zona de transição, que são projetos governamentais, que serão assistidos pelo Governo, visa também assistir aos proprietários naquelas áreas não atendidas por este projeto. Ao lado disso, teremos ainda, dentro do meio rural nordestino, os projetos agropecuários do FINOR, que são também, projetos de grandes propriedades, porque o Projeto Sertanejo visa somente atender as pequenas propriedades, até 500 hectares.

 

L.F. Então, a ação do Governo, através de todos estes programas, naturalmente, não poderão oferecer resultados imediatos, resultados a curto prazo que possam eliminar de vez o flagelo da seca, quando essa ocorrer eventualmente, não é?

 

O.P. Mas, a continuação desses programas é essencial para que a médio e longo prazo se possa minimizar esses flagelos, esses efeitos danosos que a seca traz para a população nordestina. Achamos que a ação do Governo deve sempre se orientar para esses programas a médio e longo prazo, sem, no entanto, descuidar aqueles problemas assistenciais que deverão ser implementados, no caso da ocorrência de seca e que continuarão a ser inevitável, até que estes programas atinjam um grau de implementação que elimine o problema. Achamos que as ações que devem ser desenvolvidas, devem ser no sentido da continuidade a esse programa, de fortalecer os órgãos regionais, principalmente a SUDENE – Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, o Banco do Nordeste, o DNOCS – Departamento Nacional de Obras Contra as Secase a CODEFASF – Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba, para que disponham de melhor estruturação, de melhores recursos humanos, materiais e tecnológicos, para que esses programas tenham continuidade, principalmente recursos financeiros, evitando a descontinuidade que foi uma característica, principalmente, dos anos anteriores a 64. A história nos mostra, se nós analisarmos os orçamentos do DNOCS, verificamos a intermitência do afluxo de recursos que eram postos à disposição do DNOCS, de maneira que as ações que o órgão desenvolvia não tinham continuidade.

 

L.F. E quanto ao aspecto de apoio tecnológico?

 

O.P. Devemos ressaltar que o Governo, recentemente, instalou, no Nordeste, alguns centros de pesquisas que deverão, a curto prazo, começar a influir nessas providências, melhorar o aspecto do apoio tecnológico a esses programas do Governo, na região. Eu me refiro ao Centro de Pesquisas Trópico Semiárido, instalado em Petrolina, já com equipe de 43 técnicos da mais alta capacitação, inclusive com cursos de pós-graduação no exterior e que já veem estudando todos os problemas inerentes às características próprias do Nordeste, principalmente no que se diz respeito ao aproveitamento dos recursos naturais, a planta xerófila, a pastagem nativa e outros recursos que são naturais do Nordeste.

Também a IMBRAPA já instalou em campina grande o Centro Nacional de pesquisas do Algodão, que é uma grande riqueza, uma grande xerófila, tem uma grande importância na economia nordestina. Já instalou em Cruz das Almas, na Bahia, o Centro Nacional de Pesquisas da Mandioca e da Fruticultura. Já criou e está em fase de instalação, em Sobral, no Ceará, o Centro Nacional de Caprinocultura. Esses Centros de Pesquisas deverão desenvolver aqueles estudos para fornecer o apoio tecnológico da melhoria desses programas de Governo.

 

L.F. E quanto a questão das fontes de serviço?

 

O.P. Há muita gente que pensa que a frente de serviço é uma improvisação, que na frente de serviço o Governo é tomado de surpresa, na ocorrência de uma seca, e por falta de outra medida mais planejada, de melhor efeito, se improvisa a frente de serviço, o que não ocorre mais. A SUDENE tem uma larga experiência na condução da assistência aos flagelados e dispõe de um plano anual que é elaborado com a participação dos governos estaduais e dos órgãos que atuam na região. Esse plano visa ordenar as providências que devem ser desencadeadas tão logo ocorra o fenômeno da seca.

Neste plano são previstas todas as ações de todos os órgãos envolvidos; prevê todas as obras que deverão ser atacadas, no caso de ocorrer a seca; já prevê, inclusive, a estocagem em determinados pontos estratégicos e ferramentas para serem rapidamente usadas no caso da ocorrência de seca. Enfim, a ação de assistência, em caso de ocorrência de seca, está toda ela concebida, dentro de um plano, que, rapidamente, poderá ser implementado.

 

L.F. Creio que a seca tem que ser concebida como uma emergência?

 

O.P.  

Sim, uma catástrofe que ocorre. É como ocorre catástrofes em outras regiões do mundo. Nenhum país se aparelha, se prepara para atender terremotos, quando estes ocorrem. Mobiliza-se todos os instrumentos de Governo para atender à população flagelada. É a mesma coisa que ocorre com o problema da seca. Nós não podemos nos dar ao luxo de nos manter, toda uma estrutura ociosa montada, prontinha, esperando a ocorrência de seca para ser acionada.

Este problema não é fácil mas tem sido uma preocupação constante de todos os órgãos, tanto da SUDENE, quanto do DNOCS, quanto dos governos estaduais, procurar tirar o melhor proveito possível daquelas frentes de serviço.

No ano passado, já ficou muito patenteada esta preocupação. As frentes de serviço, por exemplo, do DNOCS, foram, de preferência, deslocadas para projetos de irrigação, com vistas a que o trabalho ali desenvolvido fosse uma contribuição real ao problema geral que se procura resolver, implementar, dar uma contribuição ao projeto de irrigação. Isso já foi feito o ano passado.

Outra mão de obra de emergência foi, também utilizada no ano passado, na construção de pequenos e médios açudes e que, inclusive, estamos procurando, aqueles que estão a cargo do DNOCS, recursos para concluir esses açudes, mesmo que esteja concluído o período de seca, com vistas a que os vultosos recursos que foram empregados naquelas frentes de serviços, tenham um resultado mais positivo.

Acredito que, no momento, não exista, à disposição dos órgãos, outra solução para atender à emergência, a não ser as frentes de serviço. O que nós devemos nos preocupar é, realmente, tirar o melhor proveito desta mão de obra, destes recursos que são despendidos nas frentes de serviço para que contribuam para o programa geral, a longo prazo.

 

L.F. A água é fator limitativo, mas são reconhecidos os resultados dos açudes construídos em cooperação com particulares, pergunto se não seria aconselhável o retorno da política antiga de construção de açudes em cooperação, serviria para possibilitar irrigação a baixo custo e ao mesmo tempo aumentar a possibilidade da produção?

 

O.P. O DNOCS desenvolveu, durante algum tempo, aquele programa de construção de açudes pelo sistema de cooperação. O DNOCS elaborava o projeto e entrava com o prêmio que equivale a 50% do valor da construção. Posteriormente, esse programa foi desativado, considerando que era paternalista e não devia o Governo doar um prêmio ao proprietário. Mas esse programa de construção de açudes vai ser retomado, agora, através do Projeto Sertanejo, em condições muito melhores do que aquele programa anterior, simplesmente da construção do açude.

Nós sabemos que o açude é importante no Nordeste, em virtude do problema da água, há necessidade de reparar água, há necessidade de criar em cada propriedade uma fonte de água que independa da chuva. Mas o açude, sozinho, não resolve o problema, ele tem que ser complementado com seu aproveitamento, ou através da irrigação ou outro qualquer aproveitamento. E o Projeto Sertanejo, como que inspirado no programa de açudagem em cooperação, voltar com esse programa, mas numa roupagem bem mais eficiente, porque o Projeto Sertanejo vai permitir que o proprietário pequeno e médio construa seu açude e sua irrigação, com financiamento do Governo, em condições extremamente favoráveis.

O Projeto Sertanejo prevê o financiamento até 450 mil cruzeiros por propriedade, em condições de juro de 2% ao ano, com o prazo de 20 anos para pagar e 6 anos de carência. Quer dizer, estas condições de financiamento são as mais favoráveis que já foram postas à disposição do proprietário. Não temos dúvida nenhuma de que o Projeto Sertanejo é muito superior àquele projeto de cooperação que o DNOCS hoje não está fazendo.

 

L.F. Sempre se fala em açudagem, poços profundos, e ficou esquecido, justamente, a grande ajuda a estas áreas da irrigação. É sabido que nossos rios, durante os períodos de chuva corre com abundante água, levando umidade às suas margens. Logo que termina o período de chuva os rios secam e acontece o fenômeno contrário, passam a ser drenos naturais. Por que não se desenvolve o regime das barragens vertedoras e das barragens submersas?

 

O.P. O problema é o seguinte. O DNOCS hoje está desenvolvendo sua ação nos grandes vales. E, hoje, nós iniciamos o estudo do vale como um plano diretor para o desenvolvimento do vale. Estamos desenvolvendo, atualmente, estudos como foi feito para o Vale do Jaguaribe. No Vale do Jaguaribe, a partir de 1962, através da missão francesa foram estudados todos os recursos do Vale do Jaguaribe e elaborado um Plano Diretor para o desenvolvimento do vale. Esse plano diretor envolvia o Vale do Gurgueia, o Baixo Parnaíba, o Acaraú, o Apodi, o Açu etc.

De acordo com estes estudos são indicadas todas as soluções possíveis de serem implementadas para o desenvolvimento daquele vale, para um aproveitamento, principalmente, com vistas ao aproveitamento racional de água e solo existentes no vale.

De maneira que esse mesmo estudo vai ser feito a nível de propriedade, no caso do Projeto Sertanejo, a nível de núcleo que será um estudo mais integrado e desenvolvido pela SUDENE, e a nível de cada propriedade será desenvolvido, indicado o projeto de transformação daquela propriedade, indicando todas as obras que terão de ser feitas para tornar aquelas propriedades resistentes a seca.

De maneira que o problema da barragem submersa, da barragem vertedora é um caso a ser estudado de acordo com as condições locais. Existe uma preocupação muito grande, hoje, em todo o Governo, no problema do aproveitamento e da preservação dos recursos de água no Nordeste, da definição de uma política de utilização da água do Nordeste. A SUDENE já está desenvolvendo estudos neste sentido, porque este problema da construção de açudes deve obedecer a uma disciplinação.

 

L.F. O que o senhor acha do aproveitamento da mão de obra ociosa, por ocasião das secas, nas próprias propriedades rurais atingidas? Para o deputado Ernesto Valente, por meio de financiamentos bancários ou de bolsas de trabalho, com financiamento subsidiado, juros subsidiados, prazo de carência a longo prazo, ao invés do deslocamento da imensa massa de trabalhadores para as frentes de trabalho, representam o ordenamento de plano da SUDENE. Isto porque se dá o aproveitamento dessa massa humana de trabalhadores nas próprias propriedades agrícolas?

 

O.P. O problema levantado pelo Deputado Ernesto Valente é um problema que já foi analisado, principalmente pela SUDENE, o problema se reveste de uma complexidade muito grande. Realmente, o ideal e o que se procura fazer com o Projeto Sertanejo, com programas de irrigação, com programas de áreas mistas etc, é a fixação do homem na propriedade. A longo prazo, são todos esses programas que estão sendo desenvolvidos, mas quando ocorre a seca, naturalmente, o proprietário não tem condições, devido a estrutura de sua propriedade, de reter aqueles seus moradores. Então, aquela mão de obra fica disponível e procura assistência. Como assisti-la?

Assisti-lo na propriedade, o Governo procura fazê-lo através dos financiamentos. Se o Governo, por exemplo, no ano passado, ofereceu condições para investimentos, créditos a condições extremamente favoráveis para aqueles proprietários que quisessem empregar sua mão de obra disponível, melhorar sua estrutura da propriedade, para faturamento e o tornar mais resistente a seca.

Mas a forma que o Deputado Ernesto Valente levantou, do Governo dar o dinheiro ao proprietário para, simplesmente, pagar a mão de obra e ela ficar na propriedade, até agora não foi considerada válida, pela SUDENE, tornar-se-ia extremamente difícil o controle da frequência dessa mão de obra, o controle do pagamento, o controle do rendimento dessa mão de obra. Mas, as linhas de crédito já existem para isso. O Dr. Salmito pode informar, no ano passado, quais foram as condições de crédito oferecidos aos proprietários, especiais, em função da emergência e somente aplicados naquelas áreas onde estava ocorrendo a seca.

Uma ideia do Senhor Mauro Rangel é um programa em que cada empresa apresentaria, previamente, um plano para fazer aplicações, aqueles investimentos que tornam a propriedade mais resistente, menos vulnerável, no caso de seca. Nesse plano se definiria os itens a serem cumpridos, a mão de obra necessária e um orçamento. Esse plano seria encaminhado, para que fosse estendido a todo o Nordeste, a ideia final deverá ser esta, à SUDENE então a SUDENE teria, de cada propriedade agrícola, um plano que seria executado no caso de se configurar uma seca. Para tornar-se mais fácil o controle, os agentes financeiros, os bancos oficiais, os bancos estaduais é que caberiam liberar estes recursos. Então, os recursos para financiar seriam esses que o Governo utiliza para manter a frente de serviço, e a frente de serviço ficaria como uma reserva estratégica, seria o seguro de desemprego, então ela não seria, na verdade, extinta mas permaneceria como uma reserva e essa massa de recursos seria então alocada nas propriedades, naquelas condições do Projeto Sertanejo, ou seja, 20 anos, 2% de juro ou até a fundo perdido.

 

L.F. Eu também, acho válida, porque o objetivo final é fixar o homem na propriedade.

 

Luciara Silveira de Aragão e Frota

● Coordenadora do NEHSC Fortaleza ● Membro do Conselho Editorial deste site

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado.