A Poetisa Cora Coralina
A poetisa emérita Cora Coralina era geralmente descrita por muitos como “uma mulherzinha do povo”.
Nada poderia ser mais errado. Pessoa que passou por maus bocados na infância, sim, mas “mulherzinha do povo” jamais.
Ana Lins dos Guimarães Peixoto, que assinava suas poesias com o nome de Cora Coralina, descendia de duas linhagens nobres de Pernambuco: os Lins e os Guimarães Peixoto, que produziram muitos nomes de grande distinção na história do Brasil. Mais ainda, era prima legítima do poeta Olavo Bilac, cujo nome completo era Olavo de Brás Martins dos Guimarães Bilac.
O genealogista Borges da Fonseca, em seu estudo, intitulado Nobiliarquia Pernambucana, informa que a família Lins chegou a Pernambuco através dos irmãos Cristóvão e Sebaldo Lins, que traziam carta de apresentação do Grão Duque de Toscana. Nessa carta eram descritos como “italianos”, e “de antiga família do nosso ducado”. Seus nomes eram grafados nesse documento como Christophoro e Ciobaldo Lins. Vieram ao Brasil atuando como agentes de banqueiros Fuggers, judeus alemães, que financiavam as plantações de cana de açúcar de Pernambuco. Dita carta lhes dava a cidadania italiana, e fazia-os cristãos, ficando assim livres de quaisquer acusações de que fossem judeus.
Na realidade tratavam-se dos irmãos Christoph and Sebald Linz (com Z), originários de Ulm, Alemanha. Por que razão alemães insistiriam em se declararem italianos? Sem dúvida para esconder algum outro tipo de ancestralidade não aceita no Brasil colonial.
Os Linz alemães traçam sua ancestralidade a partir da cidade de Ulm, sendo que a primeira menção desse nome teria aparecido ali em 1389, assim afirmou o jornalista Albrecht Rieder – no jornal Ulm Teigeizeitung, em 20 de outubro de 1930. Uma versão brasileira desse artigo, ainda não publicada, é intitulada “Christoph Linz veleja ao Brasil. Uma família antiga de Ulm conquista o mundo”. Rieder afirmou que esses irmãos alemães vieram ao Brasil e se tornaram prósperos donos de muitos engenhos, na região de Porto Calvo, em Alagoas. Sabendo-se que Rieder escreveu isso nos tempos de Adolph Hitler, esse artigo sem dúvida pretendia comprovar que os Linz alemães eram de pura ancestralidade ariana. Seria isso verdade? Como é que alemães goi – não judeus – teriam sido enviados como agentes de uma casa bancária judaica? É difícil acreditar nisso.
Conforme já dito, os irmãos Linz foram primeiramente enviados a Portugal, como agentes da casa bancária dos Fuggers, que financiava os plantadores de cana de açúcar em Pernambuco. Subseqüentemente vieram ao Brasil. Ao chegar a Pernambuco, Christoph se casou com Inez Fernandez, neta de Arnau de Holanda, nobre holandês-alemão que chegara ao Brasil em 1535, com Duarte Coelho Pereira, donatário da capitania de Pernambuco. Arnau de Holanda por sua vez se casara com uma filha da famosa judia Branca Dias, e seu marido Diogo Fernandes, donos do engenho da Muribeca. Arnau de Holanda alegadamente era filho de uma irmã do Papa Adriano VI, o primeiro e único papa holandês da Igreja Católica. Sem dúvida alguma os Lins de Pernambuco descendiam de gente de estirpe nobre.
O lado Guimarães Peixoto, de Cora Coralina, não deixa de ser menos nobre. O primeiro desse nome no Brasil foi o Dr. Domingos Ribeiro dos Guimarães Peixoto, Barão de Iguaraçu. Era médico da Imperial Câmara, e como tal assistiu os nascimentos de D. Pedro II, bem como os de suas irmãs. Dentro dessa tradição médica, os Guimarães Peixoto produziram toda uma linhagem de médicos pernambucanos desse mesmo nome, bem como juristas renomados. O pai de Ana Lins dos Guimarães Peixoto foi o desembargador Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto, de Goiás Velho, então a capital do Estado de Goiás. Esse jurista pernambucano fora para Goiás por nomeação de D. Pedro II.
O Desembargador Francisco de Paula Lins dos Guimarães Peixoto tendo falecido prematuramente, numa época quando não havia nenhum sistema de benefício governamental ou proteção aos órfãos e viúvas dos funcionários públicos, sua família ficou destituída e passou por maus bocados. No entanto, na minha ótica, essa condição de pobreza eventual, não fazia de Cora Coralina “uma mulherzinha do povo”, como afirmam aqueles que ignoram os antecedentes nobres da poetisa goiana, descendente do Barão de Iguaraçu, e prima legítima do poeta Olavo dos Guimarães Bilac.
Lido 2552 vezes